Por Natália Viana
O Dia Mundial da Liberdade de Imprensa caiu no mesmo sábado em que Lady Gaga deu show histórico em Copacabana. Foi um sábado ensolarado no Rio de Janeiro, e diante de qualquer lojinha ou quiosque onde se passasse, só tocavam os hits da cantora. Sentada em um café, reparei num rapaz magricelo e sem camisa, que tocava no violão uma das músicas mais conhecidas, passando de bar em bar para atrair gorjetas dos clientes. Na sua boca, “Shallow Now” virava uma sequência rocambolesca de onomatopeias sem sentido, apenas seguindo o fio condutor da melodia.
Eu não estava no Rio para vibrar na areia lotada, mas para encontrar uma fonte. Diferentemente da multidão que chegou ao Rio e se mostrava animadíssima desde os dias anteriores, com correntes no pescoço, roupas de vinil coladas pelo corpo, transparências e lantejoulas, eu estava miserável pela coincidência de datas. Queria fazer meu trabalho em paz, complicado pelos engarrafamentos homéricos, as longas filas em qualquer café, o clima de carnaval no ar. Apesar de ter feito dezenas de ligações, a fonte, que mora no Rio, foi postergando e pediu para o papo ser no domingo, afinal. Não havia hospedagem a menos de mil reais por quarto quando precisei ficar um dia a mais, pois era o dia do dito show. Lição número um do jornalismo: quando uma fonte quer falar, você tem que estar à disposição. Uma tia generosa abriu sua casa pra me abrigar. Perdi o voo. Consegui espaço num dos últimos ônibus de domingo à noite, adentrando a madrugada. É da minha poltrona no bom e velho semi leito da 1001 que eu termino essa newsletter/coluna. Não bastasse o show, o colega da poltrona ao lado está vendo vídeos da Lady Gaga sem parar. Penso que tenho certa inveja de quem vem despreocupado ao Rio para ver o show da Lady Gaga. Muitas vezes, ser jornalista é levar o mundo sobre os ombros, correr atrás da impossível tarefa de descobrir o que aconteceu, de fato, no mundo.
Penso que o rapaz aqui do lado não sabe, nem imagina, qual é o trabalho de um jornalista. E sei que temos falhado em explicar. Muita gente não sabe que existem profissionais que passam os dias, as noites, e muitas vezes o fim de semana ligando para fontes, lendo documentos, ouvindo relatos, destrinchando tabelas e tabelas de Excel e lendo arquivos em PDF para tentar chegar ao mais perto possível da verdade – essa palavra tão maltratada hoje em dia. Quase um palavrão.
Muita gente não sabe que é o que esses profissionais apuram e publicam que depois vai virar frase e efeito indignada na boca de algum apresentador de podcast ou influenciador em rede social; que vai virar meme, que vai ser repercutido em dezenas de programas de Youtube que não são mais que mesas-redondas de notícia onde comentaristas exaltados palpitam sobre algo que já foi publicado por algum jornalista, que passou horas apurando.
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